domingo, 28 de novembro de 2010

Maria


Maria doou suas roupas velhas
Se desfez do perfume antigo
E deixou aquelas músicas
Colocou AM ao invés de FM

Aos poucos todos aqueles objetos
carregados de sentimento
Foram perdendo o seu valor
Para entrarem no rol de apenas objetos

Maria se desfez da máquina de costura
Estava cansada de remendar seu coração
Adotou as cicatrizes
E deixou o tecido recompor-se

Maria cansou do feijão,
da louça, das florezinhas da praça,
da praça.
Cortou os cabelos

Maria deixou de ir com as outras
Abriu as gavetas
E esqueceu as roupas na chuva
Perdeu aquele trem

Maria jogou as calcinha velhas fora
e rejuvenesceu com isso
Perdeu os sapatos apertados
E pintou as unhas de vermelho

E depois de tudo,
continuou tão Maria quanto antes.

Mayara Floss

domingo, 21 de novembro de 2010

Sinestesia


Estava procurando um poema
Que se encaixa-se nesse sentimento
Minto
Estava procurando um sentimento
Que se encaixa-se nesse poema
Minto
Porque poemas e sentimentos
Continuam cheios de palavras
ou cheios de mentiras

Mayara Floss

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Quadros


Faça um som ruim
Para me despertar,
Conte tudo sobre a tua vida
Mas nunca fale do coração

Encontre a receita da felicidade
Na banca de revistas
Mas, claro, alguém sempre já
versificou antes

E a sua mão vai estar
na loja da esquina
Não esqueça de pedir o segredo
e alguma esperança de brinde

Não é culpa sua
Se trocar os sentimentos pela nova moda
Porém, não esqueça de trocar
os canais da televisão

Também, não saia do ritmo
que a alegria é a próxima
mercadoria de jornal

Tantas cartolas já saíram
dos meus coelhos
Que o meu rock
mais parece samba

Deixei as cartas no portão
E essa noite o sol vai brilhar
Mas não prometa nada
Pois já rubaram o brilho da lua

E o próximo eclipse
Esta na prateleira de qualquer lugar
Já procurei consolo
Mas o remoto controle não tem a geografia
Das tuas mãos

Embora não precise se preocupar,
Pois para todo nó na garganta
Existe uma superstição

Mayara Floss

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Exílio

Foto: Fabiano Trichez

E na sua escuridão
Ficava mudo
Só lia as sombras
Não encontrava as palavras
Apenas escutava as corridas
O campear, as asas
E as cordas golpeadas
Perdidas no silêncio
Vibravam como um tormento
E ele apenas pedia tempo
Para soar uma lembrança
Uma lágrima, uma desesperança
Sentia o pago iluminado
E sabia que a noite tinha convidado
A campear a volta
Com as estrelas de escolta
A procura da sua querência
Pedia em cada despedia
Para orar em sua ausência
Solitário sentia a melodia
E a sua cicatriz ardia
Procurando o seu exílio
Contava a sua história
Revivia a sua memória
Sentia a batalha em seus dedos
E via o último instante da navalha
Do fogo e apenas lembrava
Da última imagem da sua amada
E de tanto procurar,
Às vezes pensava
Se naquela escuridão
Ainda iria encontrar
Motivos para sua canção
E deixava os versos dissonantes
Guardava as lágrimas
Para quando iria deixar de ser errante
E abraçar a sua prenda
Antes que o tempo o prenda
Nos espinhos da Rosa Flor
Seu eterno amor
E nos braços da sua amada
Reencontre a sua morada

Mayara Floss

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